quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O VELÓRIO DA ESCOLA E A MORTE DO ADULTO

Do sociólogo Luciano Alvarenga:

Na escola Objetivo da cidade de Promissão, interior de São Paulo, os alunos do colegial fizeram um corredor polonês e aguardaram o professor passar, professor este que cometeu o equívoco de ter impedido que dois ou três alunos entrassem na sala de aula após o sinal. O dito professor foi agredido verbalmente e ouviu todo tipo de xingamento já conhecido e inventado.


Numa outra escola particular, agora em Rio Preto, também interior, onde acontecia uma reunião de pais e mestres a mãe de dada aluna levantou-se para comentar alguma coisa, quando foi abruptamente interrompida pela filha com a seguinte frase: “cala a boca mãe, a senhora não sabe nada”.

Que a escola é uma morta insepulta não resta mais dúvida, que os professores nada mais tem a dizer que seja mais óbvio que o Google está claro a todos aqueles que dão aula. Que a escola se transformou num cárcere que visa manter em “estado de controle”, temporal, uma juventude sem paradeiro, sem formação ética e sem referência moral também está evidente. Que o mercado de trabalho não precisa mais da escola na maioria dos setores econômicos, basta ver pela distância entre o que escola pensa que ensina e o que o mercado cobra como formação.

Mas outra coisa se esconde naqueles dois episódios além do velório da escola. É a morte do adulto. Segundo a psicanalista Maria Rita Kehl a pelos menos 40 anos que a sociedade brasileira caminha sem a figura psicológica do adulto. Estamos vagando entre a infância cada vez mais reduzida e juventude e a terceira idade; terceira idade é um eufemismo para velho. O fato é que magicamente as pessoas passam a vida jovem e de repente estão na terceira idade, mas nunca são adultas.

A escola era um outro da autoridade do adulto. Sem adulto não faz sentido escola. O desmonte da família e sua transformação em um amontoado de indivíduos preocupados apenas com sua biografia também é resultado da morte do adulto. Se todos são jovens o papel de pai e mãe e filhos fazem cada vez menos sentidos, na verdade não faz sentido algum.

Ora, todos que trabalhamos em escola sabemos que a idade é um abismo que se forma entre professor e aluno. Que os professores que conseguem alguma relação com seus formandos, a maioria tem menos de trinta anos, ou, é algum tipo maluco que finge ser maluco para se manter vivo na sala de aula. A agressão ao professor está dentro deste contexto, alguém sem autoridade imaginou que pudesse riscar uma linha no chão dizendo quem pode o quê. Ninguém pode nada que não seja consenso estabelecido pela exigência da maioria – dos jovens. Além do mais, não são alunos, são clientes.

Numa sociedade que tem ojeriza do adulto – adulto é aquele que faz o papel de chato, cobrando, negando, exigindo – é natural que quando ele apareça seja logo posto em silêncio e lembrado de que sua função não existe mais, ainda por que “a senhora não sabe nada”. Nessa horizontalidade que tem como métrica a jovialidade, a leveza, o descompromisso, o fruir das sensações e desejos, é inadmissível que alguém numa dada situação, ainda mais na escola, venha a se comportar como adulto.

Tudo isso é alvorecer de um totalitarismo sobre os velhos e qualquer outro que não seja jovem, inclui-se os feios, os gordos, os defeituosos os diferentes de qualquer gênero ou grau. Beautiful People o site que não aceita feios ou alquebrados de qualquer natureza é revelador dos tempos que emergem nesta próxima década. O sucesso do site pelo mundo e sua presença em 89 países evidencia a alegria incontida em que os escolhidos se desprendem dos “outros” em direção ao éden. Explica também o sucesso das cirurgias plásticas.

Estes dias me disseram que tal bar era muito bacana... “só tem gente bonita”.


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